Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém (PA)
Multiplicam-se os cumprimentos de Natal e Ano Novo, votos que expressam os melhores desejos e augúrios, nascidos daquela reserva de amor e sensibilidade plantada por Deus e nosso coração. Não são diferentes as palavras e os gestos que a Igreja quer levar a todos os homens e mulheres de boa vontade, amados do Senhor.
Um dos privilégios da vida do Bispo, pastor visível da Igreja, é o contato com pessoas e grupos diferentes, constatando os diversos modos de preparação para o Natal, em sua maior parte muito edificantes. Nesta semana, presidi a Santa Missa no Abrigo João Paulo II, em Marituba, nesta Arquidiocese de Belém. Este Abrigo se localiza na antiga Colônia de Hansenianos, visitada por São João Paulo II quando veio a Belém. Ali, sacerdotes, religiosos e religiosas, médicos, funcionários e muitas pessoas envolvidas no acompanhamento dos irmãos e irmãs enfermos, dão testemunho da caridade vivida.
Para minha agradável surpresa, estava ali presente um casal que celebrou o Sacramento do Matrimônio há poucos dias, levando ao abrigo os presentes que constavam de sua lista de matrimônio. Aos amigos participantes da festa de casamento, pediram que qualquer presente fosse para o Abrigo João Paulo II! Gesto criativo, sinal de maturidade cristã, Natal acontecendo nos presentes que chegavam aos hansenianos.
Ao final da Missa, um interno do Abrigo, Jorge da Silva, assim se expressou numa linda e profunda mensagem de Natal, que faço minha, de coração:
“Maria, Maria... Não temas, Maria. Bendita foste tu aos olhos de Deus, pois conceberás e darás à luz um filho e o chamarás Jesus, o Salvador do mundo. Com estas palavras, chega ao ventre daquela simples mulher aquele que do mundo seria o Salvador, aquele que nasceria sob o fardo do capim, sob o olhar dos animais, mas traria em sua sina uma sentença já decretada, sofrer por mim, por você e por todos nós, sem escolher caminho ou estrada. Sua missão: semear a paz e a verdade, implantar o amor em cada coração, sem olhar defeito ou perfeição, pois todo o seu martírio por nós nos traria a salvação. Hoje comemoramos este nascimento com festas, banquetes, confraternizações. E suas dores, o martírio, que por nós passou, lembramo-nos de agradecer? Às vezes, sim, às vezes não, mas este Jesus hoje renasce em nossos corações, e a ele devemos a nossa salvação. Contudo, busquemos ser um pouco como ele neste Natal, semeando a paz, aprendendo a perdoar, estendendo as mãos aos sofridos, sem em recompensa pensar, pois a recompensa merecida, dos altos céus ele nos dará! Que este Natal seja para nós também um novo renascer, o renascer para uma nova vida sem ódio, sem mágoas, sem rancor. Que nossas mãos estejam sempre estendidas para amparar o pobre, o rico, o branco, o preto e o mendigo sofredor. Um feliz e abençoado Natal a toda a direção, funcionários e amigos do Abrigo João Paulo II. São os votos sinceros e todos os residentes”.
Não é difícil imaginar a emoção que tomou conta do meu coração e de todas as pessoas presentes. A beleza das faces, algumas machucadas pela enfermidade, mas todas enfeitadas com a graça de Deus, ofereceu o tom adequado para a o Natal antecipado! Sabedoria pura é saber que o Natal não é uma fábrica de ilusões, pois o Filho de Deus que veio até nós e assumiu nossa carne veio para dar a sua vida. Um hanseniano corajoso e poético ao mesmo tempo transita entre as palavras salvação, martírio, paz, vida, com mais coragem e liberdade do que muitas vezes somos capazes. O apelo pungente é a buscarmos ser parecidos como Jesus, semeando paz, aprendendo a perdoar, nova vida, sem ódio, sem mágoas. O espaço em que estas palavras ressoavam poderia ser apenas de dor, mas eram de esperança e de partilha, alegria incontida de quem sabe o que é Natal!
Ali, o convite à partilha generosa de recém-casados capazes de dar e não guardar presentes era um espetáculo discreto, silencioso e eloquente. Vale o apelo a que o Natal que celebramos seja de verdade a festa do amor, da verdade, partilha sincera, gestos de amor que se espalhem por toda parte. Nós cristãos temos o dever de testemunhar a grandeza da bondade de Deus que apareceu entre nós. O mundo sedento de amor misericordioso tem o direito à nossa resposta corajosa e sincera.
Celebramos o Natal do Jubileu da Misericórdia, proclamado pelo Papa Francisco e celebrado em toda a Igreja. Alegra-nos saber que muitas pessoas já estão bebendo na fonte da misericórdia, o Sacramento da Penitência, a magnífica efusão do perdão, oferecido por Deus a todos os que o buscam. As muitas portas santas, abertas das catedrais aos santuários, dos leitos dos enfermos às celas das prisões, e os muitos jubileus a serem celebrados nos próximos meses, sejam para todos sinal do amor de Deus. Afinal, ele nos ama de verdade!
Aproxima-se o ano novo de 2016. Nele, recebemos o convite do Papa a praticar justamente as obras de misericórdia, presentes que daremos especialmente aos mais sofredores: "As obras de misericórdia são as ações caridosas pelas quais vamos em ajuda do nosso próximo, nas suas necessidades corporais e espirituais. Instruir, aconselhar, consolar, confortar, são obras de misericórdia espirituais, como perdoar e suportar com paciência. As obras de misericórdia corporais consistem nomeadamente em dar de comer a quem tem fome, albergar quem não tem teto, vestir os nus, visitar os doentes e os presos, sepultar os mortos. Entre estes gestos, a esmola dada aos pobres é um dos principais testemunhos da caridade fraterna e também uma prática de justiça que agrada a Deus." (Catecismo da Igreja Católica 2447)
Desejo a todas as pessoas que compartilham com a Igreja o sonho da paz na terra e para alcançá-la querem dar glória a Deus nas alturas, que este seja Natal de Fé, celebrado na Igreja e na Família.