Guiados pelo Espírito de Cristo


09/06/2015 - 12:31
Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo (SP)

Que diferença há entre ser cristão e não ser cristão? A pergunta pode parecer supérflua, uma vez que se dirá logo: um cristão é batizado e é membro da Igreja de Cristo. A resposta é correta, mas não é suficiente. Embora essas duas características sejam fundamentais para definir um cristão, elas ainda não fazem aparecer o que é próprio do cristão.

Pode haver cristãos, que vivem como se o Batismo nada tivesse modificado em suas vidas: vivem como se não fossem cristãos. Ou pode haver aqueles que procuram praticar a religião apenas de forma exterior e ritual, sem que a orientação de sua vida e seu comportamento sejam impregnados por Cristo e pelo seu Evangelho.

O ser cristão manifesta-se na vida “conforme Cristo”, ou “segundo o Espírito de Cristo”, para usar expressões caras a São Paulo. Na Carta aos Gálatas (5,16-25), Paulo enfrenta essa questão pois, naquela comunidade, os fiéis eram tentados a tornar novamente às práticas da Lei Mosaica, como se nelas, em vez de Cristo, estivesse a sua segurança e salvação. O Apóstolo afirma com vigor que a justificação perante Deus é alcançada através da fé em Cristo, e não pelas práticas rituais. E fala da nova condição dos que crêem: tornam-se filhos de Deus e alcançam uma liberdade soberana, para viver sem temor, segundo o Espírito de Cristo.

Não se trata de liberdade para fazer qualquer coisa, mas para viver livres do temor, confiantes em Deus e felizes por ser filhos amados de Deus, “em Cristo”. Creio que aqui está uma das características mais preciosas do “ser cristão”: ser filhos e filhas de Deus. Essa caracterização do cristão aparece abundante, sobretudo, nos textos de São João e São Paulo. A fé em Cristo e o batismo conferem uma nova dignidade ao cristão.

Paulo vai logo às consequências: “não se deixem escravizar novamente!” E o diz em dois sentidos: não abandonar a graça imensa da fé em Cristo, para submeter-se de novo a práticas que escravizam e tiram a soberana liberdade de filhos de Deus, mediante uma religião do temor, ou uma religião feita apenas de práticas humanas, sem contar com a graça de Deus e a ação do Espírito de Cristo; ou então, deixar-se escravizar pelas paixões humanas desordenadas e pelos vícios.

“Fostes chamados, irmãos, para a liberdade: mas que essa liberdade não seja pretexto para satisfazer os desejos da carne” (5,13). “Carne” indica a vida humana levada apenas pela força dos impulsos, instintos e paixões desordenadas e ainda não orientadas pelo Espírito de Cristo. As “obras da carne” se manifestam nos vícios e nas ações destrutivas: “fornicação, impureza, libertinagem, idolatria, superstição, inimizades, lutas, rivalidades e violências, ambições e discórdias, invejas, embriaguez e orgias, e todos os excessos dessa natureza” (cf 5,19-21).

Ao contrário, ensina Paulo, a vida orientada pelo Espírito de Cristo manifesta-se em todo tipo de virtudes, que são “frutos do Espírito”: amor, alegria, paz, magnanimidade, afabilidade, bondade e confiança, mansidão e temperança. “Os que são de Cristo, crucificaram a carne com suas paixões e seus maus desejos. Se vivemos animados pelo Espírito, deixemo-nos também conduzir por ele” (cf 5,22-25).

O ser cristão, portanto, aparece numa forma nova de viver que, de um lado, é graça de Deus e, de outro, fruto do esforço coerente para orientar a vida para Deus, conforme o exemplo e o ensinamento de Cristo. Tudo o que contradiz a dignidade cristã, ainda pertence ao “homem velho”, não renovado pelo Espírito de Cristo e, por isso, deve ser deixado de lado. E tudo o que é coerente com o Evangelho é expressão da “vida nova em Cristo e no seu Espírito”; e isso deve ser buscado com todo esforço e perseverança. O viver cristão é, portanto, uma proposta de “vida nova”, orientada pelo Espírito de Cristo. E isso requer a superação dos vícios e das práticas contrárias a Deus e ao próximo, ou contra a própria dignidade; ao mesmo tempo, a vida cristã floresce em todo tipo de belas virtudes, que tornam o viver nobre e santo.


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